Pensamento linear, não linear e independência financeira


Como o pensamento linear e o pensamento não linear correlacionam-se com as variáveis necessárias para a conquista da independência financeira?
Quais os benefícios dessa conquista, desde o presente até o futuro, em meio à pessoas perdulárias e frugais?


Caros leitores, vocês concordam que para fazer boas escolhas na vida, incluindo decisões sobre investimentos, precisamos ter clareza nos pensamentos? Clareza para avaliar argumentos, ponderações, cálculos, leis e decidir, a partir de todas essas informações, o melhor caminho a seguir?

Certa vez, lendo um livro muito interessante sobre “O poder do Pensamento Matemático” – deparei-me com uma ideia interessante para compartilhar com vocês. Apesar da repulsa que provoca a algumas pessoas, a matemática auxilia a melhorar nosso modelo mental do mundo. Ela nos ajuda a superar as inseguranças, afina nossas intuições e aprimora nossa capacidade de julgamento.

Existe pensamentos lineares e não lineares também na arquitetura?
Heydar Aliyev Center, em Baku, Azerbaijão – arquitetura não linear?

Muitas das fatalidades financeiras pessoais provêm de carências de um pensamento matemático. Muitas das bobagens que são ditas por (supostos) formadores de opinião na política e na economia, seja em qualquer um dos extremos ideológicos, bem como de pessoas ligadas ao centro, são causados por falta de raciocínio lógico.

Em grande parte das metas que bati na minha vida, o pensamento matemático, adquirido no curso de engenharia, foi fundamental. Inclusive, coloquei-o como o 4º elemento que compõe a base da inteligência financeira.

E, contrariamente ao que a maioria pensa, ele não é exclusivo a quem obteve formação universitária na área. Ele é acessível a todos que demonstrarem interesse em aprender sempre mais. E esse livro é um excelente referencial.

Ah, e antes de começarmos a conversar, deixo registrado que todos os gráficos nessa postagem foram desenhados pela minha filha, formada em Arquitetura. Agradeço a ela pela ajuda e aproveito para parabenizá-la pelo sucesso até agora alcançado em sua vida profissional 🙂

A Matemática Básica

O pensamento linear

Para começar, vamos ao conceito de um raciocínio linear. Você está raciocinando linearmente se você acha que, obtendo-se um resultado em ter, consumir, poupar (muitos verbos aqui são possíveis) alguma coisa, ter, consumir, poupar ainda mais dessa coisa, potencializa o resultado inicial. E vice-versa. Ou seja, se faço isso e obtenho aquilo, quanto mais faço isso, mais daquilo vou obter.

Pensamento linear e independência financeira: o dinheiro no colchão

Existem exemplos incontestáveis onde o pensamento linear é verdadeiro. Se você coloca dinheiro regularmente embaixo de um colchão, a quantidade de dinheiro no colchão aumenta. Ignorando outras variáveis, como um roubo do dinheiro do colchão ou um incêndio queimando as notas, não há mudanças na direção do gráfico.

Se assumirmos que o colchão tenha espaço suficiente para receber o dinheiro, o gráfico será sempre uma linha crescente. Outras variáveis podem interferir mudando ligeiramente o coeficiente angular (a inclinação) da reta, mas sempre teremos um gráfico linear.

O pensamento linear admite ajustes, embora esses ajustes ainda não nos levam ao conceito da não linearidade, pois não ocorre uma inversão de tendência. O autor do livro citado não comenta essa possibilidade, deixando uma lacuna de informações nesse capítulo do livro, que acrescento aqui.

Ajustes do pensamento linear

Sua variação mais comum é o esgotamento da tendência. A tendência segue inicialmente como uma reta, proporcional entre duas variáveis. Mas depois de um tempo, não adianta uma delas aumentar, pois a outra não aumentará proporcionalmente. A curva perde a inclinação.

Pensamento linear com exaustão - o exemplo da chuva

Imaginem os leitores que vocês precisem, por qualquer motivo, sair na chuva. Inevitavelmente, vocês irão se molhar. E intuitivamente, vocês sabem que, quanto maior a intensidade da chuva, mais vocês ficarão molhados.

Temos aqui um pensamento linear. Porém, ele difere do exemplo do dinheiro no colchão, pois aqui há um limite do grau em que vocês irão se molhar.

A partir de um nível de intensidade da precipitação, vocês não se molharão ainda mais, pois já atingiram o limite máximo de, digamos, “ensopamento”. Assim, a linearidade sofre uma exaustão, assemelhando-se (mas não se tornando) uma curva exponencial.

Mas ainda assim, essa representação não tem nada a ver com um pensamento não linear, pois o gráfico não segue, em nenhum momento, uma tendência oposta. É essa situação que veremos a seguir.

O pensamento não linear e curva de Laffer

Já observava Aristóteles, em Ética a Nicômaco, que comer é bom. Mas comer muito, não faz a situação melhor. Afinal, a diferença do veneno e remédio é apenas a dose. Nem a água, longe de ser um remédio, livra-se dessa máxima.

Os leitores devem concordar que o ideal é alimentar-se de forma equilibrada, estando o ótimo em um ponto intermediário. Justamente porque a relação de comer e saúde não é uma relação linear, mas sim curva, com maus resultados em ambos os extremos (merchandising: vejam minhas experiências com a alimentação páleo, low carb e jejum intermitente). Esse exemplo nos traz ao conceito de pensamento não linear.

O pensamento não linear nos mostra que um melhor resultado ocorre quando não estamos nas extremidades das ações. E a direção em que vocês devem transitar depende do local no gráfico em que estão.

Curva de Laffer e o ponto de equilíbrio da cobrança de impostos

Esse conceito foi popularizado por Arthur Laffer na década de 1970 em um trabalho sobre a relação de alíquotas de impostos cobradas pelo governo e sua arrecadação efetiva. Definindo o eixo x, das abcissas, como o percentual da alíquota de impostos sobre a renda e o eixo y, das ordenadas, como o montante arrecadado pelo governo, obtém-se uma curva em forma de sino, onde as extremidades (não cobrar impostos e cobrar 100% de impostos sobre a renda) resulta em uma arrecadação zero,

Na curva de Laffer, se não houvesse uma alíquota mínima, não haveria arrecadação. Em outro extremo, ninguém trabalharia se 100% de seu salário fosse confiscado.

O pensamento não linear não exige simetrias da curva. Assim, a alíquota que maximiza a arrecadação não está próxima aos 50%. O melhor valor para o Estado pode estar em qualquer ponto entre as duas extremidades. E quanto maior o Estado, pior será para as pessoas que o sustentam.

Embora o assunto “impostos” (e como esse montante seria muito melhor utilizado se ficasse na mão das pessoas que produzem, e não do governo) seja um importante assunto a ser discutido (assim como o Estado babá que emerge por consequência disso), não é um assunto para essa postagem. Mas para quem deseja conhecer um pouco mais meu lado libertário, vejam aqui um exemplo de como as práticas do Estado restringem a nossa liberdade.

A independência financeira e o pensamento não linear

Fatores para independência financeira: apenas pensamentos lineares?

Vamos modificar um pouco o eixo das ordenadas na curva de Laffer e imaginar, ao invés da arrecadação de impostos, a conquista da liberdade financeira. E no eixo das abcissas, vamos colocar variáveis que são necessárias para atingir essa independência financeira.

Quais seriam essas variáveis? Podemos citar o conhecimento, entendendo como conhecimento não apenas o técnico, mas também variações necessárias para atingir nossas metas, como a inteligência emocional, a serenidade, um bom modelo mental, lucidez nas ações e a compreensão do mundo que nos cerca. Ou ainda, uma boa estratégia de alocação de ativos.

Liberdade financeira x conhecimento, poupança, alocacao de ativos.

Ok, tudo isso é necessário para atingirmos a independência financeira, mas… será que algo assemelha-se a um gráfico não linear, como a curva de Laffer?

Parece que para todas essas variáveis, quanto mais intensas, melhor, e vice-versa. De fato, é no mínimo estranho afirmar que podemos atingir mais facilmente a independência financeira com um grau “menor” dessas variáveis.

Suspeita-se que o pensamento não linear não funciona aqui. No máximo, obteremos um gráfico linear no início e uma exaustão na sequência, onde um acréscimo adicional desses fatores não influenciará, significativamente, nossos resultados.

Vamos tentar outra abordagem: além do conhecimento em geral, o que é mais necessário para atingir nossa meta? Poupança! Sim, adequar nosso orçamento para que tenhamos um superávit pomposo no final do mês e aportes maiores em nosso patrimônio.

Porém, caímos aqui em outro conceito linear. Ora, quanto mais economizarmos, maiores serão os aportes e mais rápido chegará o momento da independência financeira. Ou novamente, um gráfico inicialmente linear e posteriormente, um esgotamento da tendência.

Será então que, para aqueles que desejam a independência financeira, apenas o pensamento linear funciona? Sempre quanto mais, melhor?  

Independência financeira é o fim maior? Ou há algo além?

Aparentemente ficamos presos em um pensamento linear pois costumamos a enxergar a independência financeira de forma matemática, como o fim supremo da caminhada. Mais importante que ela, porém, é a consequência que advém em seu atingimento.

Podemos chamar essa consequência de diversas formas. Satisfação, felicidade, deleite, bem estar ou júbilo. Mas todas essas formas de sentimento, de estado, são o que você realmente deseja com a independência financeira. São esses os verdadeiros fins, independentemente de como você direciona sua vida para atingi-los.

Além disso, as renúncias a serem feitas para atingir a independência financeira, como uma maior economia no orçamento, por exemplo, devem ser bem aceitas enquanto ela não chega. Não adianta vivermos em suplício no presente esperando um mar de rosas no futuro. Não adianta desgastar nosso corpo e mente agora e chegar um caco no futuro. Não lhe vem à mente a cultura budista do caminho do meio? 

Vamos então derivar um pouco nosso raciocínio anterior. E se pensarmos no eixo da ordenada não como sendo a independência financeira em si, mas o equilíbrio entre nosso bem estar no presente e no futuro? Um equilíbrio que nos fornecerá uma satisfação no presente e a longo prazo?

E se colocarmos, agora, no eixo das abscissas. a relação de poupança e gastos do nosso orçamento? Ou seja, o quanto usaremos de nossos recursos para viver bem no presente e o quanto pouparemos para garantir nosso futuro? Ou ainda, qual o nosso grau de frugalidade que nos deixa confortáveis agora, mas garanta uma boa vida anos à frente?

Nesse caso, teremos uma curva que pode se assemelhar a essa acima. Se a pessoa obtém uma relação saudável entre poupança e gastos, obterá um maior equilíbrio na sua satisfação no presente e no futuro. As pessoas que possuem uma relação nos extremos colocam esse equilíbrio no nível zero.

Pensamento não linear - equilibrio.jpg

Uma pessoa que possui uma relação muito baixa (valores do eixo horizontal tendendo para a esquerda), sacrifica seu futuro em função do presente. Vive bem o dia de hoje, mas terá dificuldades no futuro.

Já uma pessoa que possui uma relação extremamente alta (valores do eixo horizontal tendendo para a direita), sacrifica seu presente em prol do futuro. Mais uma vez, prejudica o equilíbrio temporal.

Podemos, entretanto, ter variações ainda saudáveis nessa curva caso você seja um pouco mais perdulário do que frugal, ou vice-versa. São situações em que conquistaremos nossa independência financeira, mas tratam o presente e futuro de forma levemente distinta. Vamos a elas.

Mais perdulário do que frugal

Um ponto interessante dessa curva é que ela pode nos dar um equilíbrio entre presente e futuro adaptável ao estilo de cada pessoa.

Pensamento não linear - frugais e perdulários o perdulario.jpg

Se você for uma pessoa que dá mais importância ao presente, está conscientemente imerso na corrida de ratos, gosta de impressionar os outros e acha que sempre “merece” mais coisas materiais quando recebe um aumento, talvez sua curva seja mais parecida com essa.

O seu ponto ótimo de equilíbrio possui valores de relação de poupança e gastos tendendo à esquerda, isso é, montantes menores.

Se isso for algo consciente, não há problemas aqui. Ao menos você poupa para o futuro, evitando valores na extrema esquerda do gráfico. É uma poupança afinada ao seu estilo de vida.

Saiba, entretanto, que o tempo para conquistar a independência no futuro (não representado nesse gráfico) será maior, o que significa que sua situação presente, de dependência financeira, será maior comparado a um estilo de pessoa caracterizado a seguir.

Mais frugal do que perdulário

Agora se você é uma pessoa que valoriza o que já possui e procura extrair o máximo de utilidade das coisas ao seu redor, você é uma pessoa frugal. Você é uma pessoa segura de sim mesmo e não se preocupa em impressionar os outros. Vive uma vida equilibrada e pensa duas vezes antes de adquirir algo. Você pensa em fazer mais com menos, ou seja, você pensa em qualidade, e não em quantidade.

Pensamento não linear - frugais e perdulários.jpg

Veja nessa postagem do blog Valores Reais uma bela definição de frugalidade: “O que é frugalidade?“.

Esse grupo de pessoas sabe equilibrar-se melhor na balança entre o futuro e o presente. Garantem uma vida confortável no futuro sem se privar do que ama no presente.

A propósito, a privação nunca pode estar presente em uma vida frugal, pois levará, cedo ou tarde, à sabotagem de todos os planos orçamentários no futuro. É como uma dieta alimentar restritiva que deixa e pessoa propensa, dia a dia, a boicotá-la. É como um plano muito ousado de idas à academia, que será deixado de lado em pouco tempo.

Mas é certo que o senso de privação é diferente de pessoa a pessoa. Por isso que o gráfico não linear para as pessoas frugais tem o aspecto um pouco diferente, como visto acima. Ele tende para a direita, pois a relação de poupança e gastos tende a ser maior. Frugais precisam de menos para serem mais felizes; seu minimalismo se preocupa em gastar apenas com o que realmente importa. E consequentemente, a independência financeira chegará mais depressa para eles.

Concluindo e resumindo…

Apesar de termos uma tendência a pensarmos de modo linear, as principais situações da vida são mais bem explicadas pelo pensamento não linear. Ou no máximo, por pensamentos lineares, mas com exaustões.

Se nosso objetivo não é a independência financeira em si, mas sim o seu desfrute, precisamos definitivamente poupar reservas no presente para utilizá-las no futuro. Porém, não podemos nos privar do presente nesse processo, o que nos remete ao conceito de equilibrarmos a nossa satisfação presente com a satisfação futura. Gastar mais seu tempo com a estrada do que com a mala, como já comentei.

Se pendermos mais para o lado perdulário, precisamos estar cientes de que nosso presente – e o trabalho escravo que nos cerca, irá durar um tempo maior, antes de atingirmos a independência em relação ao nosso próprio tempo.

Se pendermos mais para o lado frugal, o futuro de liberdade virá mais rapidamente, e poderemos usar o montante acumulado para comprar nosso tempo, decidindo soberanamente onde aplicá-lo melhor. Mas, se exagerarmos, corremos o risco de perdermos algo no processo.

E a sua balança? Pende mais para qual lado? Seus comentários são muito bem vindos!

Explore mais o blog pelo menu no topo superior! E para me conhecer mais, você ainda pode…
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Anônimo
Anônimo
1 ano atrás

Gostei muito. Mas minha interpretação ficou assim…
De um lado se ta fudido, do outro tbm kkkkk

Danilo
Danilo
3 anos atrás

Ótimo post André.

Hoje aprendi que buscar sempre um equilíbrio em todas as ações da minha vida tem sido a melhor opção.
Meus parabéns.
Obrigado.

Forte abraço!

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