Locais de viagens: sua caracterização em diferentes tempos e espaços


Como os traços dos locais e cidades que visitamos modificam-se no tempo e no espaço? As viagens são sempre diferentes umas das outras?


Como expressar locais por meio de uma fotografia ou de um texto? Ou como esses mesmos locais se expressam para o viajante? A resposta não é óbvia. O fato é que a expressão está longe de ser única.

Ela é uma função do tempo e do espaço, e pode não ser bem traduzida nas viagens onde nossa presença em um mesmo local seja efêmera, sem um tempo dedicado à uma maior incorporação da sensação de “pertencimento” a aquele momento específico.

Expressão dos locais: vendedor de castanhas em Istambul nas viagens pela Turquia
Vendedor de castanhas em Istambul

Kant chamava o tempo e o espaço de “formas de sensibilidade”, e como vemos o mundo através de “lentes” diferentes, percebemos as coisas no tempo e espaço conforme nossa característica inata, ou seja, eles não existem fora de nossas próprias percepções. São sobretudo propriedades de nossa consciência e não simplesmente atributos do mundo físico. Assim, essas expectativas e compreensões serão únicas para cada indivíduo.

Espaços e tempos diferentes em um mesmo local

Locais podem expressar várias facetas diferentes, e quanto maior o desejo e as possibilidades de exploração, sem restrições físicas de determinados espaços, maior a descoberta dessa diversidade. Em continentes históricos, várias épocas estão presentes nas cidades, como presenciei na cidade de Bodrum. Construções de 2500, 1000 e 500 anos atrás misturam-se na cidade, e clamam por uma exploração mais cuidadosa.

A mesma cidade exala sensações diferentes quando exprime seu presente na marina atual, repleta de iates refletindo o estilo de vida de seus usuários. A exploração física, com tempo, faz-se imprescindível para a absorção da região de forma mais abrangente, tornando o espaço, uma função complementar e direta dessa expressão.

Em determinada região, essa mesma expressão pode modificar-se demasiadamente também com o tempo. Nos ciclos anuais e em latitudes mais elevadas, as estações do ano fazem esse papel, alterando o clima, a vegetação e influenciando os hábitos das pessoas, fatores que transformam radicalmente o local de visita.

Quando morei em Berlim, pude presenciar a mudança que as quatro estações trazem para a expressão da cidade. Berlim não é a mesma cidade em viagens no verão ou no inverno, o que gera uma mudança na forma que interpretamos as diferentes sensações nos mesmos locais apenas com a alteração desse ciclo.

Se extrapolarmos esse tempo a longo prazo, mudanças podem ser emanadas através de movimentos políticos e alterações de condições econômicas, como as manifestações que presenciei em Atenas há pouco tempo atrás. Mesmo fora de condições naturais ou situações de longo prazo, o ciclo de mudança e de novas descobertas faz parte da natureza humana, da construção e reconstrução de seus locais.

Enfim, os locais presenciados por um determinado viajante, expressará sensações e sentimentos diferentes para os futuros visitantes. A expressão que o viajante leva desses locais, portanto, não é a mesma que um outro viajante, por mais características comuns que possuem, retem em sua memória.

Locais de viagens: sua caracterização em diferentes tempos e espaços 1

As expectativas devem ser consideradas com cuidado, pois ele não vivenciará a mesma experiência. E ao invés de achar isso algo ruim, ele deve considerar o privilégio em ver o tempo e o espaço tornar suas viagens expressões únicas e, como consequência, sua absorção, o que ele leva de volta para casa, é individual, algo somente seu.

Se formos extrapolar a análise de como cada expressão interage com a individualidade de cada um, alcançaremos um número infinito de combinações, o que mostra que a nossa visão de mundo é única apenas no interior de cada indivíduo, e que a percepção do mundo físico pode ser muitas vezes relativa.

Uma excelente tese para estudantes de psicologia, à luz da filosofia de Kant. Mas, cuidado! Sem confusões com os relativismos culturais da moda, como escrevi no texto “O relativismo cultural como sanção para incoerentes tolerâncias sociais“, ok? 🙂

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Acumulador Compulsivo
4 anos atrás

André, ativa o ASKMET anti-spam pra travar essa galera aqui. rsrs

Acumulador Compulsivo
4 anos atrás

Fala André!
Essa é a incrível magia de viajar.
Eu e a esposa já viajamos para o mesmo destino algumas repetidas vezes.
E toda vez é sempre diferente.
Ainda que fiquemos no mesmo hotel/airbnb, e frequentemos os mesmos restaurantes.
Há sempre novas pessoas, novos empreendimentos, novo clima…
Essa é a delícia de viver a vida e aproveitar em viagens.
Um grande abraço, Stark.
http://www.acumuladorcompulsivo.com

Nina Rezende
Nina Rezende
11 anos atrás

Ótima análise sobre como é a percepção para cada indivíduo. É verdade, podemos até estar todos em um mesmo lugar e ao observarmos ao nosso redor tudo que encontramos; cada pessoa sentirá ou interpretará de uma maneira diferente.
Isto não significa que um esteja certo e o outro errado, porque é só uma questão de perspectiva. Um pode ficar encantado com uma paisagem e a mesma passar simplesmente despercebida para o outro.
Beijos

Fabi
Fabi
11 anos atrás

Adorei a reflexão André!!! Nunca havia pensado sob essa perspectiva.
Estou percebendo um grande talento em vc! Quem sabe uma profissão de colunista no futuro? Super beijo

André Rezende Azevedo
11 anos atrás

Exatamente Nina! As percepções são totalmente subjetivas, e não existe certo e errado nesses casos. Obrigado pelo comentário! Bjus!

André Rezende Azevedo
11 anos atrás

Obrigado Fabi! Vou mentir se já não pensei nisso um dia. Mas meu desafio é pensar em como colocar no tema "viagens" tantos assuntos que gostaria de comentar… Obrigado pelos comentários! Bjao!!!

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