Você mede risco através de indicadores de volatilidade, como o beta ou índice Sharpe?
Será que vale a pena perder tempo com esses ou outros termos técnicos do mercado financeiro?
Tempos atrás me questionaram qual o beta da minha carteira de investimentos. Achei a princípio, a pergunta curiosa, pois ela veio de uma pessoa que ainda possui um longo caminho em sua jornada até a independência financeira, apesar de estar no mercado há tempo. Fui sincero com ela e disse que não faço a menor ideia, além de sugerir que ela se preocupasse com outros fatores muito mais importantes.
Em seguida a curiosidade passou ao meu interlocutor: “Mas você não avalia o risco de sua carteira de investimentos? Isso não é importante para sua estratégia de alocação de ativos?”. Sim, equilibrar os riscos é fundamental, respondi, mas não penso que o indicador beta nos diz algo sobre riscos. Ele somente nos mostra a volatilidade de um papel. Ambos os termos – volatilidade e riscos, não são a mesma coisa, apesar da mistura confusa que muitos analistas fazem no mercado.
Mais recentemente, em setembro/2019, o CEO da Vérios contestou a metodologia que usei na comparação das rentabilidades dos robôs de investimentos no comentário do artigo. Ele disse que sua carteira carrega menor risco porque entrega uma volatilidade menor (potencializando o índice Sharpe).
A fim de esclarecer minha posição de forma geral, comento nesse texto sobre meus pensamentos sobre riscos e volatilidade, além de apontar qual seria o aspecto principal para uma estratégia vencedora no mercado.
Volatilidade e beta não medem riscos
Volatilidade baseia-se apenas na variação de um ativo em comparação a um índice padrão do mercado. Apenas isso. Para as ações brasileiras, o indicador utilizado é o IBOV. Assim, se uma ação específica variou acima do IBOV possuem um beta maior do que 1 e vice-versa. “Dizem” que ações com um beta acima de 1 são mais arriscadas.
Eu, particularmente, acho uma grande bobagem por três motivos principais:
1) A medida de volatilidade baseia-se em um histórico
É possível que você já tenha lido em prospectos de fundos de investimentos que “a rentabilidade passada não é garantia de rentabilidade futura”. Por que com a volatilidade seria diferente? Em um texto de 2019 sobre mudanças na minha alocação de ativos, comentei que a Eletropaulo subiu 91% no mês anterior, fato que gerou rebalanceamentos no meu portfólio.
Dona até então de betas comportados, nesse mês o indicador foi às nuvens! Vale até debater se esse crescimento foi fundamentado em bases sólidas ou não, mas não podemos atribuir um aumento de risco no papel por um aumento de seu beta.
2) Volatilidade e riscos nunca foram para mim, sinônimos
A volatilidade pode, realmente, ter um papel importante em operações curtas ou em lançamento de opções de ações, ambas visando o curto prazo. Mas se o leitor quiser conferir no texto “As vendas cobertas de ações aliadas à estratégia de alocação de ativos“, poderá perceber que nunca usei o beta como um indicador, mesmo para essas operações.
No texto citado, comentei que opero opções de Petrobrás e Vale por estas ações serem mais líquidas. Como suas cotações são vinculadas ao preço de commodities e relações internacionais, elas costumam ser muito mais voláteis do que o IBOV.
Nesses casos ao menos, a volatilidade pode ser considerada como uma consequência do risco de se investir em tais ações ou seus derivativos no curto prazo. Mas nunca pode ser avaliada como uma medida do risco nas operações.
Ou seja, mesmo operando em prazos exíguos, existe, no meu entendimento, uma inversão de causa e consequência entre volatilidade e risco, o que faz o uso do indicador beta inócuo. O risco, não a volatilidade, é o maior inimigo.
3) A volatilidade não altera os fundamentos de uma empresa
Se estamos falando de uma estratégia futura de independência financeira, sugiro parar de se preocupar com tolices.
Seus lucros, suas dívidas, suas distribuições de dividendos e sua governança não serão impactados por tais indicadores. Grandes quedas ou valorizações poderão ser resultados de diversos fatores, mas, tenho certeza, não serão consequências de um indicador que mede a volatilidade passada.
Existem momentos de grande volatilidade que são, inclusive, excelentes oportunidades para compras de boas empresas e preços justos. Assim, no longo prazo, principalmente, volatilidade não significa, de forma alguma, riscos na sua carteira de investimentos.
Os riscos são importantes: foque naqueles que você pode evitar
Há um tempo, escrevi o artigo “Investindo com segurança: os riscos que você pode (e deve) controlar“. Nele, comento quais são os riscos do mercado financeiro com que, de fato, devemos nos preocupar. Esse conjunto é formado por 5 ameaças que podem prejudicar nosso acúmulo patrimonial à independência financeira e são totalmente controláveis pelo investidor. O indicador beta, claramente, não é um deles.
Não pautaria minhas estratégias com indicadores que não representam nada para uma carteira de investimentos voltada ao longo prazo. O leitor mais assíduo desse blog deve saber que gosto muito de livros de história. Recentemente, um deles me proporcionou um bom exemplo real para tentarmos desfazer essa confusão de riscos e volatilidade.
Em “No tempo das especiarias: o império da pimenta e do açúcar“, o autor narra brilhantemente a saga de nossos colonizadores portugueses e suas buscas por especiarias que possibilitaram a criação de um efêmero, porém grande e poderoso, império.
Os portugueses criaram um império preocupados com volatilidade?
Na primeira metade do século XVI, os portugueses lançaram-se no mar ao Oriente para comercializar diretamente com a região da Arábia e da Índia, visando evitar os altíssimos preços das especiarias obtidas pela rota do Mediterrâneo, principalmente após os otomanos conquistarem Constantinopla em 1453. As viagens eram perigosas, pois os europeus ainda não conheciam o longo caminho de circundução do território africano para chegar àqueles territórios.
Os riscos eram imensos, e os ganhos, astronômicos para quem conseguisse retornar com mercadorias. Em uma frota com várias naus, mesmo apenas que 1/5 delas retornassem com os porões abarrotados de especiarias e as demais afundassem, a viagem estaria paga. Veja que os riscos são claros e fáceis de serem dimensionados e poderiam ser aceitos ou não por empreendedores ou financiados pela Coroa. Mas nunca ninguém pensou em algo como “volatilidade”.
Mesmo que existisse uma “média” de naufrágios mundiais e uma relação com os desastres marítimos portugueses da época, isso não seria de alguma importância, pois cada qual teria sua situação particular e não haveria base de comparação. Além do que, a tendência seria que, conhecendo melhor os mares e desenvolvendo avanços tecnológicos, a tal “volatilidade” seria cada vez menor no futuro.
Com o tempo, os portugueses foram desviando suas rotas para o Brasil, buscando aqui um porto seguro na cultura da cana-de-açúcar. E isso ocorreu basicamente por uma relação de custo-benefício: já no final da segunda metade do século XVI, nossos colonizadores começaram a encontrar uma concorrência forte dos ingleses, franceses e holandeses, que se lançaram ao mar em busca das mesmas especiarias (a Espanha, maior potência da época, navegava do outro lado do mundo pelo acordo do Tratado de Tordesilhas).
Mudanças em decisões atuais de investimentos também se baseiam em uma relação custo-benefício. Queremos sempre pagar um preço baixo por uma ação de alto valor, com o mínimo de riscos.
Tal estratégia possui relação com várias formas de análises, seja do papel quanto da conjuntura econômica local ou até internacional, em alguns casos. Mas não possui nada a ver com volatilidade e sua vinculação com riscos. Ela pode somente possuir uma pequena importância em movimentos de curto prazo, como os exemplos citados anteriormente.
Enfim, há relação entre volatilidade e riscos?
Sinto, através de conversas com amigos e conhecidos, que há uma necessidade muito grande, entre as pessoas, de possuir uma formação tecnicista para ser vencedor no mercado financeiro.
Pessoas adoram potencializar uma infinidade de detalhes técnicos fundamentalistas, amam indicadores de análise gráfica, apaixonam-se por índices beta, Sharpe (que é uma consequência do beta, com todos os seus defeitos) e usam Black e Scholes para operar derivativos, mesmo sabendo (ou não), que seus criadores quebraram o fundo LTCM deixando um buraco de mais de US$ 100bilhões.
Não existe mágica no mercado. Nenhum indicador vai levar você, à liberdade financeira por si só. Mas vocês sabem o que penso disso tudo?
Para ter sucesso na sua vida financeira, muito mais importante do que o tecnicismo, conhecimento dos mercados e indicadores fundamentalistas é o comportamento humano, evidenciado principalmente pela serenidade, disciplina e controle emocional. Para o gerenciamento de riscos na carteira de investimentos, use a Alocação de Ativos, como já comentei aqui no blog.
Alcançar a independência financeira, ou apenas possuir um bom conforto em alguma etapa da vida, é algo impossível sem a incorporação dessas características, que criarão naturalmente bons hábitos em nosso dia a dia. Muitas vezes – e notavelmente no sucesso do mercado financeiro, menos é mais. A simplicidade e o minimalismo devem ser buscados em vários ramos de nossa vida, e, guardadas as devidas proporções, Buffet e Greenblatt nos mostram que, no mercado financeiro, não é diferente.
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