As redes sociais influenciam os investidores em suas atitudes na bolsa de valores?
Como os estudos sobre conformidade podem ajudar a entender essa relação?
O número de CPFs cadastrados na bolsa de valores aumenta a cada mês. Parece ironia que os brasileiros tenham dada atenção à renda variável em meio a uma das mais agudas crises que presenciamos na economia. O alento é que a esperança de uma rápida recuperação é crescente, na medida em que descobrimos que o exagero tomou à frente da sensatez.
Com o aumento de pessoas físicas na B3, é natural que seja crescente também a participação de investidores de primeira viagem. Muitos buscam um caminho sólido e procuram aprender o básico antes de iniciar seus aportes. A maior parte, infelizmente, cresce no vácuo da tendência. Percebem que muitos estão entrando e querem entrar apenas para não ficar de fora. Reforçam a autenticidade do acrônimo inglês “FOMO”, o “fear of missing out“.
Entretanto, sem conhecimento na área e sem planejamento, como age esse grupo? Em geral, terminam por acolher opiniões alheias, resignando-se a ser apenas executores de sugestões. As redes sociais estão repletas de palpiteiros. Até onde eles podem ser a ruína do investidor?
Estudos de psicologia: o ser humano é, por natureza, conformista
Há mais de 80 anos psicólogos levam a cabo investigações sobre a conformidade humana. Muzafer Sherif foi um dos pioneiros que conduziu um estudo onde estudantes eram colocados em uma sala escura, vendo apenas um único ponto de luz, que, na verdade, era imóvel.
No grupo havia pessoas contratadas cuja função era comentar que a luz estava se movendo. As demais, verdadeiros participantes da pesquisa, eram influenciados pelos “fantoches” e concordavam com eles. Em situações indefinidas, as pessoas tendem a imitar o comportamento e as ideias de outras pessoas.
Em 1952, Solomon Asch fez um estudo com a mesma finalidade, onde o participante, dentro de um grupo de cinco pessoas, deveria definir, entre três linhas, qual possuía o mesmo comprimento de uma linha padrão, previamente apresentada. A resposta correta era negada pelos demais participantes (contratados previamente) que respondiam primeiro que o participante real.
Apesar de a resposta ser muito clara (em experimentos isolados ninguém errou a alternativa), cerca de 1/3 das pessoas responderam a mesma resposta absurda dada pelos participantes contratados. Muitos ainda deram a resposta correta, mas se sentiram muito incomodados com a situação. Uma grande demonstração de conformidade.
Será que os novos investidores (e nem os não tão novos assim que demoram para aprender muitas coisas) não se deixam levar da mesma forma pela opinião das pessoas nas redes sociais? Quais os perigos dessa prática? Veremos quais são as variáveis que influenciam essa conformidade e como elas podem nos ajudar a não cair em contos do vigário.
Variáveis que interferem na conformidade e a influência das redes sociais
Vários estudos foram conduzidos posteriormente, tornando mais claras as variáveis que promovem o grau de conformidade entre os seres humanos. Vamos a elas e comentar como elas podem ser um grande problema na área das finanças pessoas e investimentos financeiros. A lista desses aspectos foi elaborada a partir de um dos capítulos do livro “50 ideias de psicologia que você precisa conhecer“, uma boa leitura caso você goste do tema.
Ele é mais um livro que estou lendo de graça por ser assinante do Amazon Prime.
Dificuldade e ambiguidade da tarefa
Quanto mais complexo for o assunto, ou quanto menos claros forem os estímulos, mais pessoas recorrem a terceiros para resolver seu “problema”, principalmente se a tarefa envolver opiniões e atitudes de alguma forma ligadas à realidade social.
É por isso que nesse blog enfatizo muito a simplicidade em seus investimentos. Devemos focar apenas no que precisamos e no que temos conhecimento. Se você não tem tempo para estudar e acompanhar as altas variações nos preços das opções, fique fora delas. A tentação, nesse caso, de você invocar auxílio de outras pessoas (sim, há grupo de dicas de opções no Facebook) é enorme.
Você não precisa investir em todos os ativos que aparecem em sua timeline ou em seu e-mail. Há outras formas de acumular um bom patrimônio e conquistar a independência financeira, sem mendigar auxílio a pessoas que não conhece. Se mantiver uma alocação simples e entender os princípios fundamentais do rebalanceamento, você não precisará pedir ajuda a ninguém.
A natureza do estímulo
Os autores também incluem o comportamento pessoal como uma variável importante em função do tipo de decisão que as pessoas são solicitadas a tomar: quanto mais factual e claro for o problema, menor é a conformidade resultante.
Essa ideia pode estar ligada tanto aos objetivos que pretende dar ao seu portfólio (perfil de investimento) quanto ao seu perfil de investidor. Você precisa deixar explícito, para você mesmo, qual a finalidade do aporte que deseja fazer. Curto ou longo prazo? Ele será determinante para uma tarefa específica? Qual o grau de risco que deseja correr?
Da mesma forma, seu perfil de investidor deve ser claro. Você gosta do mercado financeiro? Quer estudar individualmente os ativos e tem tempo para isso? Ou prefere delegar as decisões de alocações a outras pessoas? Deixe claro o que precisa ser decidido: isso será de grande ajuda para que você siga naturalmente (e responsavelmente) seus próprios instintos.
Segurança das fontes nas redes sociais
Quanto mais acertos a pessoa possui em uma rede social, maior a confiabilidade de suas opiniões e mais chances as pessoas têm de se influenciar e se conformar com essa fonte.
Isso traz um pouco a ideia que lemos em prospectos de fundos e outros investimentos, onde “rentabilidades passadas não são garantia de rentabilidades futuras”. Mesmo que você siga pessoas “incríveis” que nunca deram uma bola fora, cuidado, pois isso não é garantia que tais acertos sempre ocorrerão.
Além disso, precisamos ter cuidado com o que é divulgado e o que não é. Influenciadores são mestres em compartilhar ostensivamente seus acertos e ocultar os erros. Uma tática muito usada é de sugerir um número infindável de ativos para investimento.
Assim, o influenciador tem muito mais possibilidades de acertar algum especificamente, que será a estrela das próximas divulgações. As perdas, em geral, ficam lá, quietinhas sem chamar a atenção de ninguém. Seja mais perspicaz que ele.
Tamanho e unanimidade do grupo
Não há uma clara distinção do tamanho do grupo, se quanto maior melhor, ou se há um “teto” onde o aumento de pessoas que podem exercer a influência possa ser alcançado. Já quanto maior a unanimidade, maior é a conformidade gerada nas redes sociais. Desvios pequenos entre a maioria podem promover uma grande redução das reações de conformidade.
Lembra de um dos principais vieses cognitivos das finanças comportamentais? Cuidado com o comportamento de manada! Tendemos a acreditar que as crenças de um grupo numeroso são verdades universais e podemos segui-las cegamente.
Nada mais longe da verdade. Muitas vezes, para ser um bom investidor, precisamos justamente nadar contra a corrente, e não agir como a maioria. Acreditar em si próprio é sempre preferível do que seguir a multidão.
Composição e aceitação do grupo
Segundo os pesquisadores, grupos coesos de status elevado e com prestígio tendem a levar maiores conformidades. Eles possuem um crédito em idiossincrasia e podem se desviar, bem como integrantes do grupo rejeitado e de baixo status; as pessoas medianas costumam ser as que mais se conformam.
Somos muito influenciados pelo efeito “ad hominem“, ou seja, a considerar uma proposição verdadeira (ou falsa) apenas sabendo que é seu emissor. Isso pode ser bom ou ruim. É bom no sentido que, se confiamos em alguém, podemos economizar um longo tempo tentando entender isoladamente uma questão na qual não somos versados. Confiar em pessoas específicas podem nos ajudar na aquisição do conhecimento.
Porém, o efeito negativo ocorre com mais frequência. Alguém com grande influência e elevado número de seguidores em redes sociais pode levar a uma aceitação cega, se não considerarmos responsavelmente suas reais credenciais. É uma isca perigosa para os mais afoitos na busca de “dicas“.
Comportamento privado ou público
As pessoas tendem a se conformar quando são solicitadas a emitir sua opinião ou agir em público e não em um contexto privado. O anonimato afeta enormemente a conformidade. Se, nas redes sociais a pessoa participa ativamente de um grupo ela tende a repetir a opinião dominante, possivelmente para evitar críticas em ser uma voz dissonante.
Esse comportamento tem uma ligação com o viés humano de que é muito mais confortável errar em grupo do que errar isoladamente. A vergonha futura tem um papel muito relevante no processo.
Para evitar tais influências, não compartilhe em público detalhes de decisões de investimentos caso sua identidade seja facilmente descoberta. Inconscientemente, você tende a tomar decisões persuadido pela opinião dominante, e a possibilidade de se afastar da manada será menor.
Sucesso ou fracasso prévio do grupo
Uma pessoa tenderá a se conformar mais com um grupo que tem uma história de sucesso do que um grupo que fracassou diversas vezes no passado.
Esse ponto não é de todo ruim. O histórico é importante para que ouçamos as pessoas certas. Mas lembrem-se que, em investimentos, o histórico de um ou dois anos é minúsculo, ainda mais quando discutimos renda variável. Antes da crise do coronavírus, o último grande baque nos mercados mundiais havia sido há mais de dez anos.
Agora pergunto: quantos influenciadores financeiros que você segue nas redes sociais estavam no mercado em 2008? Eles são financeiramente independentes, se desconsiderarmos a monetização que possuem pelos seus textos e vídeos? O que considerar, na verdade, como sucesso ou fracasso prévio? É algo necessário para reflexão.
Constância da minoria
Uma minoria convencida, constante e coerente formando um subgrupo representativo de pessoas pode influenciar em muito a opinião da maioria.
Este tópico é interessante e ajuda a consideração que a maioria nem sempre está certa. Estar atento a opiniões divergentes é importante. Infelizmente, as pessoas sentem-se mais confortáveis vivendo na “bolha” da maioria, e, antes de refletirem sobre a discórdia, preferem anulá-la apoiando a posição majoritária.
Temos novamente aqui, um pouco de “evite seguir a manada”. Faz bem a você mesmo ser uma pessoa que pensa com a própria cabeça e não aceitar tudo que é dito nas redes sociais.
Por que tendemos à conformidade nas redes sociais?
As pessoas desejam ter razão e ser valorizadas e são, assim, afetadas à influência informacional e normativa. Elas buscam sinais para orientar seu comportamento. Seu grau está muito relacionado ao conhecimento que possuímos: quanto menos informados somos, mais tendemos a seguir a multidão em um processo amplamente racional.
Por isso sempre enfatizei no blog a busca da sabedoria necessária para você ser protagonista em suas finanças pessoais e na criação de sua carteira de investimentos. Mesmo quando aceitamos ajuda externa, estamos à frente do processo se nossas decisões são tomadas de forma consciente e responsável.
Também nos conformamos para seguir a ordem social e nos encaixarmos no sistema, aceitando as pressões das redes sociais. Muitas vezes, até fora delas, com nosso grupo familiar, de lazer ou de trabalho. A necessidade de pertencer a um grupo joga, muitas vezes, em lado contrário à racionalidade.
Podemos ver isso atualmente com a pressão social ao redor da Amazônia, às minorias, ao combate ao porte legal de armas e à luta política que se transformou um caso de saúde pública. Eu, ao menos, fico pasmo como a racionalidade está alheia aos fatos e como o constrangimento e a intimidação guiam as atitudes das pessoas nas redes sociais. Muitas vezes, a decepção é muito maior que o espanto.
E, muitas vezes, esse assombro vem de pessoas que eu considerava racionais e sensatas. Ignoro as pessoas que possuem baixa autoconfiança, as quais os psicólogos das pesquisas identificaram como mais susceptíveis à conformação.
Ainda segundo eles, pessoas maduras e que dão valor ao indivíduo deveriam ser menos pressionadas do que pessoas imersas em culturas coletivistas. Talvez seja um dos fatores que devemos olhar com mais atenção antes de decidir quem ouvir e seguir e buscar sermos mais soberanos e autossuficientes em nossas decisões.
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Ótimo post André.
Parabéns.
Abraço!
Texto excelente e que se aplica a vários segmentos da vida social e não apenas a área financeira. E o pior é que cada vez mais existem pessoas que desejam ardorosamente pertencer a alguma tribo ou grupo nas redes sociais muito provavelmente pra achar respostas e resoluções pra sua baixa autoestima e insegurança Nao incluo nesse caso alguns raros e ótimos cursos ministrados por quem realmente entende do tema Mas são muito poucos
Olá Marcos!
Concordo contigo: há muito mais vontade de aplausos do que de transmissão de conceitos valorosos.
Abraço e obrigado!