Novamente, temos mais um guest post no blog!
Seu autor, Vinícius Almeida, é fundador do blog Exposição Atuarial e um profundo admirador da liberdade em suas diversas classes, tema principal desse espaço. Ele acredita que a liberdade nos impõe a responsabilidade de assumirmos nossos próprios riscos, e para isto, devemos conhecer e interpretar as vulnerabilidades de cada cenário para conduzirmos nossas vidas diante das incertezas.
O blog Exposição Atuarial apresenta conteúdos sobre assuntos diversos como: economia, probabilidade, gerência de risco, além de curiosidades relacionadas a área da matemática. O propósito do blog é ajudar a divulgar conhecimentos atuariais, e mostrar como podemos nos expor a riscos controlados.
Fiquem agora com seu artigo, escrito exclusivamente para o Viagem Lenta!
O objetivo deste artigo é apresentar os conceitos de preferência temporal e “roundaboutness”. Estes princípios são fundamentais para tornarmo-nos mais produtivos. Trabalhar a preferência temporal em conjunto com o roundaboutness é refletir sobre optar por usufruir de uma riqueza no presente ou abdicar do consumo desta riqueza com o intuito de direcioná-la para fins mais indiretos, que nos ajude a realizar funções mais imediatas de forma passiva, como uma carteira de investimentos baseada em ETFs. No longo prazo, esta prática nos economizará tempo para exercemos ativamente nossa liberdade.
Conceito de preferência temporal
A preferência temporal estabelece que, mantidos inalterados todos os outros fatores, o agente prefere satisfazer as suas necessidades ou atingir os seus objetivos o mais rapidamente possível. Ou, expresso de outra forma, que entre dois objetivos de idêntico valor do ponto de vista subjetivo do agente, este preferirá sempre o objetivo que mais proximamente se encontre disponível no tempo.
Esta lei da preferência temporal não é mais do que outra forma de expressar o princípio essencial segundo o qual todo agente, no seu processo de ação, pretende atingir seus objetivos o quanto antes.
Boëhm-Bawerk demonstrou que, mesmo quando os bens são iguais de todas as formas, incluindo qualidade, quantidade e forma, os bens presentes são mais valorizados do que os bens futuros. Esta premissa é o que torna desafiador a implementação de estruturas de produção com maiores graus de complexidade e se faz presente no ato de poupar. Apesar de conhecermos o poder do tempo no rendimento de nossas riquezas rumo à liberdade financeira, é comum vacilarmos em algumas extravagâncias.
Isto posto, é sabido que a preferência temporal é tão subjetiva e contextual, com variabilidade de um indivíduo para o outro (devido a fatores como idade e ambiente) e dentro do mesmo indivíduo de um momento para o outro devido as circunstâncias ou mudanças subjetivas de seus objetivos. A preferência temporal também pode ser racionalizada no sentido contrário, ou seja, evitar tarefas difíceis pelo maior tempo possível.
Esta postergação implica em uma situação psicológica na qual o custo de realização de um compromisso árduo de alguma forma parece mais suportável no futuro, tornando a sensação de liberdade mais bem avaliada no presente. Como exemplo, pode-se compreender a ânsia de consumir algo no presente (o que costuma ser mais prazeroso) mais difícil de suportar do que deixar de consumir e/ou economizar para a sua liberdade financeira no futuro.
Assim sendo, quando se enfrenta compromissos desagradáveis é instintiva a vontade de adiar o compromisso até o prazo limite estabelecido, deixando para realizá-los às pressas no futuro.
Estes princípios formulados por Boëhm-Bawerk foram o ponto principal de suas visões inovadoras do trade-off intertemporal entre o presente e o futuro, sendo o primeiro a ir além da produtividade do capital e da teoria das taxas de juros, trazendo em seu pensamento os aspectos cognitivos da ação humana.
Conceito de roundaboutness
A ideia de “roundaboutness” vem originalmente de Menger e foi ampliada por Boëhm-Bawerk. Em uma tentativa de conectar a relação entre o tempo usado na produção e a intensidade do capital, Boëhm-Bawerk propôs a ideia de medir o tempo de produção em uma construção chamada “período médio de produção”.
Boëhm-Bawerk concluiu que a única razão para a cadeia de produção demorar mais é adquirir uma vantagem futura de produtividade, dando mais liberdade para elaborarmos outros serviços ou mesmo dedicarmos atenção aos nossos familiares e demais lazeres. Alterada a configuração, esta nova cadeia necessitará de menos insumos, energia e/ou trabalhadores para atingir o produto esperado.
Em alguns casos, o novo arranjo de produção poderá demonstrar sua superioridade produzindo mais unidades de saída com a mesma quantidade de matéria-prima. Em outros casos, o novo método de trabalho (“roundaboutness”) conseguirá produzir um objeto final que nenhum outro arranjo mais curto e direto conseguiu entregar.
O “roundaboutness” está associado a uma escala de produção mais alongada, necessitando um período maior de maturação para realocar todos os fatores, mas que terminará alcançando um resultado de maior capacidade. A produtividade mais alta resulta do uso de bens de capital mais complexos, daí a noção de métodos de produção mais indiretos e mais “intensivos de capital”.
Como exemplo, podemos ilustrar a construção de um túnel dentro da cidade para eliminar o tempo de necessário no deslocamento de um ponto A até um ponto B. Caso queira contornar o obstáculo com uma simples estrada, a realização da mesma tende a ser mais fácil e com um custo de engenharia menor, porém levará a uma menor produtividade no deslocamento dos indivíduos dentro desta cidade.
No entanto, rearranjando os fatores para a construção de um túnel, embora mais demorada/indireta e custosa a realização do empreendimento (ao utilizar fatores mais complexos nesta produção), quando finalizada a construção o deslocamento entre dois pontos poderá ser realizado em um período menor do que seria em uma estrada contornando o obstáculo.
O conceito de “roundaboutness” aplica-se sempre quando utilizamos instrumentos que otimizem o trabalho que era feito anteriormente. Podendo obter o mesmo resultado (ou até mesmo um resultado semelhante) por um método um pouco mais “automatizado”, que permite direcionar nossos esforços para atividades que necessitem maior atenção.
Relação e aplicação dos conceitos de preferência temporal e “roundaboutness” em nossas vidas
O leitor atento já teria a possibilidade de concluir como estes dois conceitos podem ser úteis em nossa vida para conseguirmos atingir a liberdade financeira. A grande sacada para ganhar um salto de produtividade é arranjarmos os fatores de nossas produções de modo a agilizarmos nossos produtos e/ou serviços, resultando em liberdade para fazermos outras tarefas.
No Brasil, sabemos que a produtividade do trabalhador médio é abaixo da produtividade média do trabalhador mundial. Isto ocorre porque nos prendemos a atividades manuais em serviços que já são elaborados com uma intensidade de capital maior em regiões mais desenvolvidas. Ou seja, gastamos tempo em tarefas que são realizadas de forma mais rápida e efetiva por outros mecanismos de produção.
Pode-se observar esta defasagem tanto em tarefas domésticas simples (por exemplo, acesso maior a máquinas de lavar louça etc.) como em escala industrial. No subsetor de edificações e estruturas americano uma grande parte da construção utiliza uma intensidade alta de capital. As obras são feitas com muitos materiais pré-fabricados, o que faz ganhar tempo e agilidade na montagem de uma casa.
Todo este arranjo e uso de maquinário de ponta torna o prazo médio de uma construção no Brasil três vezes mais demorado do que no EUA. Outro exemplo, ainda no campo de construção civil, é a utilização de maquinário até na estruturação de calçadas. Equipamentos que operam como “impressoras de calçadas” requerem apenas que o trabalhador deposite o material em um local específico para moldá-los dentro da área delimitada para o passeio, liberando todo o serviço manual.
Paradoxo tecnologia x emprego
A questão que paira ao depararmos com este cenário é: os trabalhadores não mais serão necessários e caminharemos para um desemprego? Robert Shiller, vencedor do Nobel em economia em 2013, acredita que as dúvidas em relação a este cenário sejam apenas narrativas econômicas. Estas narrativas repetem-se através do tempo, sendo modificadas de acordo com o desafio enfrentado pela sociedade neste novo momento. O medo de que este cenário se concretize ocorre desde tempos primórdios.
No início do século XIX, na Inglaterra, os teares mecânicos foram o grande perigo para a concretização do desemprego em larga escala dos tecelões. Mais à frente o termo desemprego tecnológico surgiu e o medo que se instalava na sociedade era que robôs seriam capazes de substituir a força de trabalho por completo. Já nos anos 50, a automação foi um fator de preocupação, máquinas que controlariam outras máquinas atemorizava os trabalhadores. Medo ainda presente até os tempos de hoje, no qual a inteligência artificial seria capaz de reduzir a oferta de novos empregos.
Portanto, deve-se compreender que as tarefas serão modificadas com o avanço da tecnologia e uso intensivo de capital. Trabalhadores físicos irão exercer o papel de manutenção de máquinas que irão substituí-los, ou outra forma de arranjo produtivo que trará liberdade para o trabalhador operar serviços mais complexos.
Conclusão
O presente artigo demonstrou a psicologia por trás do desejo temporal em obter bens no presente e a eficiência de utilizar métodos indiretos na produção de bens/serviços. O custo de oportunidade enfrentado pelo agente ao tomar decisões que priorizem um ambiente mais eficiente no futuro é a chave para a produtividade. A abordagem em relação ao tempo e a forma como posicionamos nosso trabalho no período de serviço, são os alicerces para o empenho de nossas energias em rendas passivas, seja em ETFs ou fundos de investimentos, com foco no longo prazo.
Dito isto, quanto maior é a produtividade de um agente, maior será seu tempo livre para se dedicar a outras tarefas. Pode-se resumir que quando abdicamos de certos consumos no presente, usamos os recursos economizados para aumentar a intensidade do capital excedente ao nosso favor, nos levando mais perto de uma liberdade financeira, ou seja, mais tempo para desfrutarmos de afazeres mais agradáveis.
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Excelente post.
Meus parabéns.
Obrigado.
Abraço!
Obrigado, Danilo! Méritos do Vinicius!
Abraço!
Excelente Post!
Me chamou a atenção esse trecho abaixo, como isso é uma pura realidade, basta fazer uma “pesquisa” em nossa mente, para achar, muitos comportamentos que encaixam perfeitamente ai.
“…Esta postergação implica em uma situação psicológica na qual o custo de realização de um compromisso árduo de alguma forma parece mais suportável no futuro, tornando a sensação de liberdade mais bem avaliada no presente.”
Parabéns !
Abraço!
Pois é, Alexandre, o Vinicius trouxe um assunto bem interessante! Esse trecho que ele escreveu me lembrou uma referência que fiz em um texto sobre felicidade. Copio aqui para você checar: “Se retornarmos aos estudos dos antigos textos gregos, encontramos duas definições que são associadas à felicidade: hedonismo e eudaimonia. O primeiro está mais associado ao prazer imediato, presente. Você já deve ter sentido aquela carga de impulsos eufóricos que recebe em alguma situação, não? Uma felicidade plena, mas momentânea. Já a eudaimonia refere-se a algo mais a longo prazo, relativo a uma construção. Está associada muito à virtude e… Leia mais »
André,
Excelente guest post!
Eu ainda não conhecia o conceito roundaboutness.
O exemplo da construção civil mostra o quanto o Brasil precisa evoluir em vários setores.
Boa semana!
Obrigado Rosana!
Confesso que nem eu. Estar fora do mercado produtivo nos deixa meio alheios às novas ideias rsrs
Esse lance da construção civil é muito interessante. Quando escrevi sobre o dilema alugar x comprar comentei em um parágrafo a evolução das impressoras 3D na área. Será que seria um novo componente na redução de preços dos imóveis? Será que, no futuro, o custo não será muito mais vinculado à área, ao terreno, do que ao processo de construção em si?
Abraço e bom final de semana!
Olá, André.
Parabéns pelo texto. A tecnologia usada corretamente nos ajuda muito. Sou da área de TI, por exemplo, desenvolver um sistema que ajuda nos processos do dia a dia de uma empresa elimina muitos erros humanos e aumentam a produtividade, assim os produtos vendidos para o consumidor tendem a serem mais baratos. Todos ganham nisso.
Abraços!
tendem a ser*
Valeu Cowboy!
Você, sendo da área, sabe muito bem como podemos melhorar processos – e como nossa rotina pode ser um “processo” e extrairmos boas ideias e atitudes para alcançar nossas metas!
Abraço!
Excelente texto! Parabéns!
Obrigado, Maria! O Vinicius trouxe um tema bem interessante ao blog!
Abraço!
Excelente texto, André!!
Obrigado, Anon! Créditos aos Vinicius!
Abraço!