Conheça os quakers, os pioneiros na prática da liberdade religiosa e individual na história da América, e o seu legado no mundo ocidental.
Em pleno século XXI, ainda não estamos livres das coerções impostas pelo Estado, sejam veladas, como o pagamento de abusivos impostos ou impedimentos no exercício do trabalho, como a proibição de direitos básicos como ir e vir, que ocorrem ainda em vários países, como nosso vizinho do norte na América do Sul.
Cabe também a um blog sobre liberdade mostrar algumas das mentes que ajudaram a construir e disseminar a liberdade como uma inevitabilidade para que nossos direitos naturais sejam manifestados. Os quakers foram um dos grupos que alimentaram esse propósito na história da raça humana e merecem serem reconhecidos como participantes deste legado.
Os quakers na Inglaterra
As reformas religiosas na Europa no século XVI viabilizaram o surgimento de vários grupos cristãos que desafiavam tanto os dogmas do catolicismo quanto as ideias do anglicanismo inglês.
A constituição de um desses grupos, os quakers (ou “sociedade de amigos”) possuiu raízes através das ideias de George Fox em 1647 e o seu propósito estabelecia a consciência individual, e não as escrituras sagradas, como a última autoridade em questões morais, potencializando o exercício da liberdade singular da humanidade.
Esse grupo tinha como característica o tratamento entre seus membros de maneira informal, sem títulos, sendo cada pessoa o sacerdote de si mesmo e, não existindo assim, a necessidade de clero ou igrejas.
Para eles, Deus era um ser benevolente e permitia a salvação a todos que a procurassem. Os quakers entraram assim, em confronto com outros grupos cristãos reformistas, como os puritanos calvinistas, que pregavam a predestinação como meio para a salvação, e consideravam-se eles mesmos, um grupo de eleitos por Deus para habitar uma nova terra prometida.
A marginalização dos quakers na Inglaterra e Willam Penn
Não é difícil avaliar que conflitos entre esses dois grupos eram corriqueiros, principalmente se considerarmos que viviam em uma época na história da Inglaterra onde a religião estava inserida em uma briga sucessiva do trono.
Os quakers sofriam frequentes perseguições pelos anglicanos e católicos, muitos padecendo sob os rótulos de bruxaria que eram estampados em ações contra a sua doutrina libertária, e consequentemente, com constantes punições como execuções e mutilações.
Dessa forma, os quakers, na Inglaterra do século XVII, era um grupo socialmente marginalizado. Nesse contexto, o filho homônimo do almirante inglês Willam Penn, o qual possuiu um significativo papel na guerra anglo-hispânica nas Antilhas, iniciava ainda jovem uma admiração pelas ideias do grupo através da influência de Thomas Loe.
Suas ideias sobre a liberdade eram potencialmente poderosas e influenciaram muito Penn filho desde sua adolescência, consolidando-se em seus valores principalmente após sua viagem para a Holanda, país que na época era um símbolo na construção de uma comunidade baseada na liberdade religiosa.
O jovem Willam Penn, após estudos em Paris e de direito em Londres, passou a frequentar as reuniões dos quakers, e apesar de possuir um significativo prestígio junto a nobreza em função de sua educação e ascendência, sofreu duros reveses na tentativa de conquistar a liberdade de pregação religiosa para todo o grupo, incorporando em sua biografia a visita em inúmeras prisões.
Em uma dessas ocasiões, escreveu grande quantidade de textos que caracterizavam os princípios do quakerismo, cuja máxima mais conhecida foi “No cross, No crown” (“nem cruz, nem coroa”), uma manifestação clara contra o ataque à liberdade pela repressão religiosa e pela nobreza, tornando claro que Deus poderia falar de diversas formas a cada indivíduo.
Os quakers na América
Inconformado com o insucesso na tentativa de estabelecer uma tolerância religiosa na Inglaterra e utilizando-se de seu bom trânsito entre a nobreza, conseguiu permissão para administrar um expressivo lote de terras e organizar um povoamento quaker na América, deixando a Inglaterra livre da pregação de suas ideias e aliviada com a possível supressão dos conflitos em seu território.
Em 1681, o rei confiou* e autorizou sua posse às terras a oeste do Rio Delaware e deu o nome de Pennsylvania (“florestas de Penn”) ao local, em homenagem ao seu pai, já falecido. Seria mais uma tentativa de enviar para a América os grupos religiosos avessos ao culto oficial do país.
Já para a cidade fundada por Penn, junto à primeira leva de colonos, foi atribuído o nome de Filadélfia, cujo significado em grego é “cidade do amor fraterno”. Oferecendo liberdade religiosa, atraiu um número impressionante de colonos ingleses, mesmo não pertencentes do grupo dos quakers.
A Pensilvânia recebeu ainda muitos alemães da seita menonita, os quais fundaram, próximo à Filadélfia a cidade de Germantown, ratificando que a concessão da liberdade sempre exerce um efeito de atração imenso nos indivíduos.
Durante a colonização norte-americana, foi natural surgirem vários conflitos com outros grupos religiosos. Os puritanos, que se intitulavam como os eleitos de Deus e comparando a América com sua Canaã, perseguiram os novos vizinhos, reeditando rivalidades que existiam desde suas pregações na Inglaterra.
Assim, eles, que antes eram também perseguidos no Velho Mundo por intolerância religiosa, passaram a perseguir os quakers pelo mesmo motivo – o código moral nem sempre se mantém se atravessamos o outro lado da mesa. Penn e seu grupo, entretanto, lutaram novamente na América, contra essa nova perseguição religiosa mantendo seus ideais. Posteriormente suas conquistas foram admiradas por muitos, inclusive Voltaire, que citou seus feitos em seu Dicionário Filosófico:
“ (…) No ano seguinte Penn (1682) promulgou seu código de leis. A primeira foi a total liberdade civil (…). A seguinte foi uma proibição absoluta contra as taxas cobradas por advogados (…). A terceira foi a admissão de todas as religiões e a permissão para cada habitante adorar a Deus em sua própria casa, sem nunca tomar parte no culto público.”
O legado dos quakers na história
A alfabetização como ferramenta para a liberdade de interpretação da Bíblia, foi uma prática de muitos grupos de colonos na América, e não foi diferente com os quakers. A cidade de Filadélfia tornou-se um dos maiores núcleos urbanos das colônias americanas e do império inglês. Possuía excelentes índices de alfabetização, superiores inclusive, que a maioria das cidades da metrópole, e foi considerada como um dos locais de maior tolerância religiosa do mundo.
Fiel aos ideais de liberdade, Penn ainda insistia que as mulheres mereciam ter os mesmos direitos que os homens, e não simplesmente obrigá-las a seguir estereótipos impostos pelos movimentos feministas atuais. Com seu conhecimento em Direito, estabeleceu uma constituição escrita que limitava o poder do governo, trazia um código penal humanitário e garantia várias liberdades fundamentais. Ideias poderosas para serem defendidas e aplicadas na nossa história atual.
Um grande centro comercial floresceu na Filadélfia e com as instituições solidificadas pelos conceitos de liberdade construídos pelos quakers, principalmente pela figura de Penn, a cidade cresceu também como foco intelectual e irradiador de ideias.
As raízes da colonização da cidade influenciaram seu protagonismo no futuro país por muitos anos. Foi o local onde a Declaração de Independência foi assinada por Thomas Jefferson quase 100 anos depois e posteriormente, com uma mesma janela de 100 anos, foi novamente sede da primeira exposição científica internacional dos EUA.
Veja mais algumas ideias de Thomas Jefferson e John Locke sobre liberdade e direitos no artigo “Liberdade e Poder: os direitos naturais de John Locke revisitados “.
Mesmo realizando considerações e atenuações sobre os diferentes contextos e pensamentos da época, é inusitado, porém, que apesar de os quakers estarem na vanguarda nas ideias de liberdade, a instituição da escravidão só foi combatida de forma mais eficaz em meados do século XVIII. Influenciados pelo huguenote francês Anthony Bénézet e seu trabalho na educação de escravos, estabeleceram uma sociedade com vistas à abolição da escravatura, que viria ocorrer apenas 100 anos depois.
Atualmente, os quakers possuem mais de 200.000 membros no mundo, com mais da metade desse total, residente nos Estados Unidos.
* Algumas fontes dizem que essa cessão se deu em troca do cancelamento de uma dívida adquirida pelo governo
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Excelente!
Foi muito bom viajar nessa breve história dos Quakers. Maravilhoso o teu blog. Parabéns!
Obrigado, Anon! Abraço!
Ótimo post André.
Muito interessante.
Parabéns e um forte abraço!
Obrigado, Danilo!
Abração!
Muito bom o texto, aprendo bastante aqui no blog. Abraço.
Obrigado, Ana Paula! Fico feliz em compartilhar!
Abraço!
Gostei muito. Estou lendo um livro que comentou sobre os Quaker e me interessei pelo assunto. Obrigada pelas informações!
Obrigado pela leitura, Erica!
Pode indicar o livro ou outros que trabalham o movimento quaker?
Olá Esdras!
Reli sobre eles nos livros dessa coleção, que, inclusive, possui leitura gratuita se você for assinante do Kindle Unlimited: https://amzn.to/2ZNz4Ke
Eventualmente, assino para ver as novidades.
Abraço!
Não entendi essa estratégia de trade
Não entendi o comentário.
Muito interessante o artigo VL 🙂
Uta!
Valeu colega!
E eu nem sabia nada sobre Quakers ! Boa leitura !
(Re) Descobri em um livro da história dos Estados Unidos que estava lendo. Abraço!
Show
🙂